“Quelé – A voz da cor” é o relato definitivo da grandiosidade de Clementina de Jesus
Para quem não sabe a Rosa de Ouro Comunicação tem esse nome em homenagem à Clementina de Jesus. Rosa de Ouro foi o show que consagrou a cantora, que entre jongos, curimas, cantos de trabalho e sambas de partido-alto, trilhou brilhantemente, uma carreira com 11 álbuns gravados com um vasto repertório de cultura popular brasileira.
“Em nossos ouvidos mal-acostumados pela seda e pelo veludo produzidos pelos cantores da época, a voz de Clementina penetrou como uma navalha”, escreveu certa vez o jornalista e musicólogo Ary Vasconcelos.“A ferida ainda está aberta e sangra, mas isso é saudável: serve para nos lembrar que a África permanece viva entre nós.”
A história por trás da “voz de navalha” que surgiu na década de 1960 e se tornou símbolo de brasilidade em pleno reinado da bossa nova e do iê-iê-iê é o tema do novo lançamento da editora Civilização Brasileira: “Quelé, a voz da cor: biografia de Clementina de Jesus”, livro que resulta do trabalho incansável e minucioso das duas jornalistas e diretoras da Rosa de Ouro Comunicação Janaína Marquesini e Raquel, em co autoria com Felipe Castro e Luana Costa, também jornalistas. Uma obra surgida como trabalho de conclusão do quarteto no curso de Jornalismo da Universidade Metodista de São Paulo e que, além da nota máxima pela banca avaliadora, valeu a eles premiações como uma da própria universidade e duas da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares de Comunicação.
O reconhecimento dos primeiros leitores não foi sem razão. Por meio do livro, a trajetória de Clementina de Jesus vai muito além da história que invariavelmente se repete nas fontes tradicionais: da empregada doméstica que se transformou em cantora aos 64 anos de idade e gravou sucessos como “Marinheiro só” (do repertório tradicional). A obra também passa a limpo o ano de nascimento da cantora – 1901 e não 1902 (como informa a maioria das fontes) – e nos leva ao início do século XX na cidade de Valença (RJ), onde começa a saga da menina Quelé, filha dos escravos libertos Amélia Laura e Paulo Baptista dos Santos. A história nos leva ao Rio de Janeiro, onde a pequena vai morar aos sete anos e terá as primeiras experiências como cantora (no pastoril de João Cartolinha) e sambista – primeiro na escola de samba Unidos do Riachuelo e, depois, na Portela.
E sabe-se que foi numa festa de São João em 1938 que Clementina cruzou os primeiros olhares com o ferroviário (depois estivador) Albino Pé Grande, com quem se casa e por quem se converte ao verde-e-rosa da Estação Primeira de Mangueira. E que era no Grajaú que ela ganhava a vida como doméstica até encontrar, na antiga Taberna da Glória, o personagem decisivo para o início de sua vida artística, o poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho, que fará de Quelé a figura central do samba que se revigora em meados dos anos 60, através de espetáculos como o emblemático “Rosa de ouro” (1965), produção de Hermínio que apresenta também os jovens Paulinho da Viola e Elton Medeiros.
“Ela é minha melhor obra, melhor que meus sambas e poemas”, escreve Hermínio, que será o produtor da maior parte da discografia impecável gravada pela cantora até a década de 1980. Período em que Clementina faz valer sua condição de “mulúduri” (herdeira da ancestralidade) e atua como uma autêntica “griô” (transmissora desta herança), levando sua voz ancestral a tudo que é canto: das concorridas Noitadas de Samba do Teatro Opinião ao Perdidos na Noite (programa de TV apresentado por Fausto Silva), do Festival de Arte Negra em Dacar (Senegal) ao badalado Festival de Cannes (no Sul da França), onde canta a “Marselhesa” e troca mimos e elogios com a diva Sophia Loren.
Sua morte, aos 86 anos, pobre como a maioria de seu povo, nos faz voltar à realidade. Felizmente, permanecem sua arte e memórias como as que estão contadas em “Quelé, a voz da cor: biografia de Clementina de Jesus”. Livro que, na contramão de um famoso ditado africano (“Toda vez que morre um velho, é uma biblioteca que vai embora”), mantém viva e afiada a “voz de navalha” que não nos deixa esquecer de nossas raízes.
A orelha do livro foi assinada pelo escritor e historiador Luiz Antônio Simas e prefácio do poeta e produtor Hermínio Bello de Carvalho.
Confira as críticas sobre o livro:
“(…)em nome do otimismo, Felipe, Janaína, Luana e Raquel nos fazem acreditar que ainda há por aí jovens como eles, interessados em redescobrir o Brasil. (…) “Quelé — A voz da cor”, um livro clara e competentemente bem escrito, é mais do que a história de uma Cinderela negra. Nos dá sobre Clementina as informações biográficas necessárias, passa em revista seus discos, fala de uma força de intérprete capaz de iluminar todo um teatro, quando não um estádio.” João Máximo – O Globo
“Não subumbiram às dificuldades que cercam a história de uma pessoa tão representativa na cultura oral” Luiz Fernando Vianna – Folha de S. Paulo
“A turma que fez esse trabalho não escreveu apenas uma biografia da Mãe Quelé. O que essas páginas apresentam é um relato fundamental para se contar a história da nossa música e dos saberes africanos redimensionados no Brasil: aqueles guardados e transmitidos pela voz ancestral da Mãe, que nos faz lembrar o tempo todo de onde vem o nosso canto maior de invenção da vida. Saravá!” Luiz Antonio Simas – Historiador
“Quelé, a voz da cor: Biografia de Clementina de Jesus prova que há muitos bons jornalistas no país dispostos a não se conformar com o clima de determinismo sombrio que paira sobre o panorama cultural brasileiro. Que insiste na ideia de que “o Brasil nunca foi Brasil”, segundo a fina ironia de Aldir Blanc.” Welington Andrade – Revista Cult
“Foi assim que a monografia virou livro – dos bons – assinado pelo quarteto. Quelé, a voz da cor – Biografia de Clementina de Jesus é mais do que oportuno. Chega no momento em que o Brasil questiona o próprio preconceito, escamoteado pelo mito da democracia racial” Ângela Faria – Estado de Minas
Informações técnicas
Páginas: 384
Preço: R$ 49,90
Editora: Civilização Brasileira | Grupo Editorial Record
Sobre os autores:
Janaína Marquesini, Felipe Castro, Luana Costa e Raquel Munhoz se aproximaram na faculdade por suas afinidades. “Quelé – A voz da cor” começou como um trabalho de conclusão do curso de jornalismo, mas superou as expectativas e obteve o reconhecimento da comunidade acadêmica com duas premiações pela Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, primeiro do Sudeste, depois do Brasil. Daí em diante foram muitas viagens entre Rio de Janeiro e São Paulo e a persistência em vencer a resistência natural de tantos que desconfiaram da enorme empreitada que era transformar a pesquisa numa biografia.
Janaína Marquesini é mineira radicada em São Paulo desde 1999. É jornalista e diretora da agência de comunicação Rosa de Ouro. Acumula experiências em marketing para o setor público, atendendo associações e grandes órgãos do serviço público nacional. Formada pela Universidade Metodista de São Paulo e pós-graduada em estudos brasileiros pela FESPSP, dedica-se paralelamente a pesquisas na área cultural.
Raquel Munhoz nasceu no tradicional bairro da Mooca, em São Paulo. Formou–se em jornalismo na Universidade Metodista de São Paulo e é pós-graduada em mídia, política e sociedade pela FESPSP. Foi produtora na TV dos Trabalhadores e atuou na Secretaria de Cultura de Santo André. É diretora da agência de comunicação Rosa de Ouro, dedicando-se a pesquisas biográficas de empresas, instituições, associações e órgãos do setor público.
Felipe Castro é jornalista, miltonascimentista e palmeirense. Formou-se em jornalismo pela Universidade Metodista de São Paulo, com pós-graduação em ciência política pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). Tem passagens em portais de notícia, jornais e assessoria de imprensa.
Luana Costa é uma jornalista paulistana com experiência em portais de notícia, jornais e agências de comunicação. É graduada pela Universidade Metodista de São Paulo e pós-graduada em Cultura pela Universidade de São Paulo (USP). Dedica sua carreira às causas sociais no terceiro setor, com foco em incidência política e direitos humanos.